TERMINUS 1
_____POEMA 9 ___________
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Não sei o teu novo código postal
mas sei que estás aí, mãe,
aí, debaixo dessa pedra
que ainda há pouco tempo
mandei compor
na tua cabeceira...
deixo-te este ramo de rosas
vermelhas de ira
e vermelhas de raiva...
faz-me falta o teu silêncio
o afago do teu sorriso,
o teu encolher de ombros
a angélica luz dos teus olhares...
e deixo-te estas rosas,
no dia dos teus anos
porque sei ,
eu sei que continuas a observar-me
desse buraco escuro,
logo depois da pedra
que se partiu,
onde escondes a face
e descansas o corpo
que te deixei esticado numa tarde...
em Setembro...
e é daí que vês,
é daí que obervas a loucura
e esta maldição, este não querer,
esta mordaça, esta insatisfação
dumas entranhas frágeis...
Deixo-te rosas mãe,
o tempo já é pouco
aonde habitas...
são vermelhas de raiva,
tingidas de palavras
de vingança
de mim próprio...
vermelhas são papoilas
das searas que não lavrei
dentro de mim.
Deixo-tas
Para me esquecer
do tempo esfarrapado
deste despir por nada
como lugres que voltam
com o porão vazio.
São vermelhas, mãe
Com o choros que te deixo ficar
na lisura da pedra ataviada
onde te deitas hirta...
vermelhas...
e regadas no engano
onde ponho os limites
impossiveis...
serena-me os sentidos
neste ramo de flores
e deixa-me fugir
e não voltar.
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~~~~~~POEMA 7~~~~~~~
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Escuto a minha voz
nas vozes que se escutam
nos prédios de três andares
que infestam o outro lado da cidade,
são poucos os poemas que se abrigam
na descoberta das ruas
insegura a palavra que não rima
ao fim de cada abraço
se o autocarro amarelo passa
para se precipitar no vão da escada
por uma porta aberta no horário.
A serrania dorme nos seus medos
lá , para lá da ponte , para lá do rio
e da curva que dá descanso ás águas
e dos salgueiros perfiladas margens
na lama dos caniços no terror da manhã
no pântano , na cheia , nos lobos ou na sorte
de quem desce sem barca
pelo silêncio agreste do tumulto.
Se a alma é uma anarquia de pedaços
são precisos os lábios para aquecer os sonhos
para erguer os tijolos para fazer as praças
para escrever as frases do nosso entendimento
para nos darmos as mãos , para existir
e procurar pagar todos os impostos
com ira , raiva e o discernimento
que nos faça acordar no outro dia.
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___________SAÍDA_______________
Quizeste abrir a porta por onde entraste
se queres sair pois não te impeço, sai
não sei se levas mais do que deixaste
ou se deixaste mais do que aí vai.
++++
Foi hesitante, leve, não segura
a experência entre nós,pelo meu lado
podes levar o que trouxeste, na pura
convicção de muito ter ficado.
++++
Orando aos deuses vou dia após dia
consumindo no mundo a vida eterna
não te vejo passar nem a agonia
se a levas contigo me governa.
++++
O vazio do tempo é quanto basta
á minha resumida previsão
nada mais me consome nem me arrasta
no regresso aos segredos do meu chão.
++++
Leva tudo o que queiras pouco importa
na mistura que temos a esquecer
para abrir ou fechar já não há porta
nem há tempo sequer de a fazer.
_______POEMA 10__________
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No fim da terra, havia um rio
de sonho em sonho, fez-se, sei lá
de leito cheio, leito vazio,
que lhe fizeram , barcos de estio,
que o vento norte já não lhes dá ?
x
Vento passante, vento e trovão
cumes da serra , que é dos teus sóis
coitos em fuga, aonde estão
os pensamentos vindos de então
de então erguidos como faróis ?
x
Espectros, fantasmas, por onde habitam
tantos segredos ditos sem voz
onde se perdem, onde se agitam
que danças tecem, que letras gritam
os que voaram, dentro de nós ?
x
Que regras ávidas de sofrimento
a sangue dizem que isto é assim,
já não há roupas ? Não há momento ?
não há principio? Não há unguento ?
já não há noiva ? Não há festim ?
x
Margem da noite , tão fria e nua
mora nas sombras tanto pensar
sonho que em medo se desvirtua
acorrentado na luz da lua
cego de vida , á mão do luar.
.
____GUI_________
Não te deites na areia pela praia
nas arribas torradas ou no vento
que esquece o tempo desse mar de genes
que te passa na frente
não agites as sombras que do sol
passeiam pelos corpos transparentes
tudo o que foi e nada está ausente
nesse mar calmo claro como sempre
se vês não grites que fazê-lo é vão
não é fluxo de água o que ali corre
na ravina do rio quando acorda
a madrugada nua e a lua cheia
faz deslisar por tudo quanto é raiva
nosso fugir acorrentado em vão
não de abandono não de esquecimento.
Esqueci-me de nós na natureza e ira
de fantasma e porão e nos segredos
do deserto queimado pelas vagas
do sol do verão de chamas ardiloso
pela praia que estendida de chapéus
deixa aproximar a gente quase nua
ou como assombração vai semeando
pernas e seios descobertos pontos
para sorver os raios e as palmeiras
perfiladas na rua
escasso tempo e de fome
nos contornos do espasmo dum gemido
quantos adeus são fáceis de dizer
quantos corpos são mais que o simples nome
o frágil fingimento
antes que o tempo pare de correr.
____GUI-1_______________
.
Nada perdeste em me deixar ficar
ao fundo da escada num monte de palavras
já não havia sentido nem diziam
mais do que já esquecemos
do início que não chegou a ser
sob a vista das pedras dos poetas
a noite dos nossos batizados impacientes
x
Podemos abandonar ao fundo das escadas
tudo o que não vestimos
tudo o que não chegou a ser de novo
ambos utilizamos numa segunda vez os restos
parte que não ficou da estreia original
por erros gestuais e emoções
subtraídas ao controle da fertilidade dos sentidos
x
Atiraste esse pouco para a rua
como se nada fosse e nada foi portanto
no espaço interior do teu sorrir
sabe-se lá se no procurar de alguma coisa
o calendário a encontrará um dia
nas gavetas profundas das ruínas que habitamos
inadvertidos , ignorantes, ávidos
da dolorosa ausência ?
x
Amanhã o dia será pior que o outro
e sucessivamente
fabricamos o tédio a insatisfação
em cada sopro de vida renascida
ou mesmo na secura que nos invade o ser
fabricamos em sonho o abandono
de cada dia seguinte
o último e o único que sempre se poderá pedir
ao fundo duma escada
ou noutro sítio qualquer.
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MOMENTO_________
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Nunca me despedi . Estou desarmado
na manhã que findou .Mastro sem vela
com uma dor no peito e mais aquela
de quem sempre estou longe, aqui ao lado.
x
Nunca fugi , que fortaleza tinha ,
quanta desbaratei , quanta me dava
gasta por nada ter ! Nada ficava
também nada partia e nada vinha.
x
Nasci na ventania e vou morrer
tempestuoso, só e argumento
que nem contestação possa merecer
x
decalque aliás da gente que aqui passa
a vida é um segundo , é um momento
neutrão veloz de infinita argamassa.
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~~~~PLASMA~~~~~~~~~~~
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Foi ela que fugiu do que me dava
coitada, arrependeu-se de ter medo
ao ver que o céu azul não tem segredo
como cais de estação , quarto de hotel,
temeu pela palavra que não tinha
inócua, vazia e sem perfume
fundiu-se no engano e no queixume
numa tarde de junho , antes do verão
vitimou-se sózinha
decapitada em choro e confusão.
x
Teve rosas nas mãos
na pele macia nos lábios de setim
beijos de amor
procurou no principio o mesmo fim
e teve o que não teve mais além
do seu pequeno corpo a duvidar
mas não disse a ninguem
que poderia amar
morreu de ignorância , julgando-a
sabendo que se fosse , muita ou pouca
no tempo se haveria de mostrar.
x
Hoje passa por ali e não é mais
que resto duma imagem
ébria de encenação
já lhe falta a firmeza da saúde
e o silêncio que traz parece-nos virtude
duma virgem qualquer
perplexo presumo a existência
dum mar em turbilhão
não lhe chamo excelência
mas sim ,senhora sim, senhora não.
GÉNOVA
.
Levas-me a Génova mostras-me a Lanterna
que me há-de apagar na tua ausência
gosto de te ver rir e do teu sonho
fazer mais que de mim , fraca experiência
xxxx
que levas tu na mão senão desejo
de seres procura e insatisfação
remota busca que não falte ensejo
de ser a porta doutra imensidão.
xxxx
cala-te na distãncia a outra face
de querer e de não querer passar além
tu és um bojador se não temeres
será teu outro mundo que aí vem.
xxxx
leva-me a Génova ao porto e ás vielas
de amar uma cidade navegante
ali ressurgirei nas caravelas
de português sem leme nem sextante.
xxxx
leva-me ao porto para cheirar o mar
salgado do país que me deixou
leva-me ao porto se eu quiser voltar
na nau do novo tempo que passou.
xxxx
apanharei no cais o teu sorriso
quando o vento o trouxer e a tempestade
para nele chorar se for preciso
morrer impregnado de saudade.
PARTIDA
.
Partiste tu tinhas que partir
estava escrito nas pedras e no tempo
hesitações do pó do pensamento
o sopro do teu sonho de voar
asas de algum lugar
à procura de ti
x
e tinhas que partir pelo teu caminho
partir pelo teu pé
para te encontrares talvez ébria de vinho
para medires o amor
para saberes do mar
ao largo em teus silêncios escutar
o berço que trazemos
o nosso parto a nossa dor
x
e tinhas que deixar-me
quebrado o coração
os olhos num regato nos ásperos minutos
do meu inutil cais
que se destrói por si
abana tece
a luta que anda em mim
que me enlouquece
velha carcaça em busca do seu fim
_____________COIMBRA_______________
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São sete da manhã
renasce o dia
e não te via assim
Coimbra
há muitos anos
vestida de romã
dispersa...
como eu próprio
me dispersei por ti
na memória do tempo
no silêncio
x
não se escuta o cantar
do carro eléctrico....
o quatro, o sete
o oito
em Santa Cruz
quando o principio era
nem existia fim
x
não te via Coimbra
na veste dos salgueiros
nas résteas do choupal
solene imobilizada
no alto das colinas
se me pergunto o que é feito de ti
nada respondes
escondida no tempo
perdida na saudade
nas ruas da cidade
onde me conheci
~~~~~~FIRENZE~~~~~~~~
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Dos dois um figurante foi apenas
por sobre a Ponte Vechia observando
os turcos movimentos
da bailarina rosa
leves como espelhar de águas do rio
os pés de violino no vazio
sobre as pedras da ponte
como eu próprio passava
e absorvia ao pôr do sol ,
a fonte.
x
Um só , um só definitivo esteio
no ocre iluminado
da tarde no seu fim
um pedaço que seca outro que arde
e música a dançar constantemente
no consumido chão
que tem de mim
por entre gente
de toda a ocasião.
x
Na quietute do sol que exibe os tons
no breve pôr
vejo setins que voam rodopiam
no meu olhar castanho
que vai que volta
que ora se prende á tule
ligeira e frágil
ora se solta
num solfejo ágil
de penumbra e de cor
_________NOCTURNO_________
É na noite que nasce o nosso amor proibido
é na bruma dos dois que vens. Como se fosses
a escrita do meu tempo , imaginários doces
do caminho obscuro onde me fui esquecido
x
E na bruma de nós em cada noite espero
o corpo do teu corpo, o fogo do teu seio
da hora mais banal ao meu maior anseio
na vibração comum onde me agarro e quero.
x
É na inquietação que a busca tanto ignora,
suor regado ao som de nós em cada beijo,
que eu afogo o teu mar , observo e então vejo
as perguntas de então nas respostas de agora.
x
E vem a madrugada, as mãos, o crepitar
a embriaguez em tanto fogo e tanta dor
que apetece voltar subitamente ao amor
e ali morrer no fim da noite , a baloiçar~
_____TU_________
Não fosses tu e o teu olhar sereno
só de aparência feito e transmitido
eu não seria eu, nem o ameno
poisar do sol teria algum sentido.
x
Não fosse esse interior desconhecido
onde se fazem nuvens de vapor
eu não faria o eu que tenho sido
nem tu figura a que chamei amor.
x
Não fosse o que se quer, ignorando
a certeza que temos mais real ,
ou a loucura a arder de vez em quando
x
nada seria belo , nem igual
á imagem que em nós se vai criando
dum sonho muitas vezes irreal.
~~~~~~~SOMBRAS~~~~~~
verdes tíleiras minhas sentinelas
sombra dos dias tórridos de agosto
depósito de vidas
e a fresca claridade acreditava
que amanhã e depois tudo mudava
na expressão do olhar e do teu rosto
x
Minhas artérias descomprometidas
limpas de tempestades como agosto
dormitavam serenas no limite
do limite não ter
nem feridas nem esquémias nem saber
da água dos canais
ter a certeza de que o sol nascia
num mundo sem ter fim dia após dia
x
Verdes tileiras de profanas flores
ébrias de luz talvez de vinho tinto
esbranquiçadas pela tarde lenta
hoje lá dorme o coração cansado
que ora se opõe ainda perfilado
ora sucumbe á paz
e à tormenta
_____BREVE__________
Um sopro ou uma luz
cálida tarde espanha
branca de pureza
raios de sol e sul
a cor dos olhos
a cor dos lábios
o rosado da face
a mostrar-se á manhã
e tudo o resto é nada
um circulo fechado
A penumbra do espaço
é um sentido
um roubo
uma agressão
uma carícia
e o calor dos seios
a delicia
dum colo redondo
onde baloiça o corpo
que nos enlaça a alma
nos acalma
até á extremidade do caminho
para nos trazer a paz devagarinho
ou mergulhar
no abismo
da senhora Del Rocio
.
SIOUX
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Os sioux foram as vitimas históricas
dos náufragos piratas doutras eras
do paraíso que há no novo mundo
tão velho como as guerras
de espingardas de bombas de napalme
no outro lado do mar...
fica Bagdad cidade milenar e berço
da civilização
onde se implantam
assassinos desordeiros
e mais alguns obreiros com boas intenções
o sete de cavalaria e toda a porcaria
da loucura veloz da quimera do ouro
x
a exterminação dos apaches
as reservas dos indios e dos homens
e a limpeza étnica
as grades de guantanamo
as bombas de hiroxima
e Bagdad Bagdad
quantos mil anos ?????
x
cantar em verso esta proeza crua
da nudez dos impérios
em fita celuloide é a glória
das novas babilónias
que faz nascer o choro e a revolta
a raiva o ódio a morte
pois já não se suportam no eufrates
os feitos inventados
da idiota história dos cow boys
de revolver na mão
e ferrugentas latas invasoras
para roubar petróleo.
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